Curta “Nós é Ruim e Mora Longe” leva a jornada da juventude periférica de BH à tela do Cine Santa Tereza

Filme de Ítalo Almeida acompanha Rayra em uma noite de festa que revela barreiras, afetos

Foto: Ítalo Almeida

O curta “Nós é Ruim e Mora Longe”, novo trabalho do diretor mineiro Ítalo Almeida, tem pré-estreia marcada para 21 de dezembro, às 17h, no Cine Santa Tereza, dentro da VI Mostra Periferia Cinema do Mundo, com ingressos gratuitos pela bilheteria ou Sympla. A narrativa acompanha uma noite na vida de Rayra, 22 anos, moradora do bairro Juliana, na Zona Norte de Belo Horizonte, que decide atravessar a cidade para ir a uma festa na véspera do primeiro emprego — deslocamento simples em aparência, mas que, para jovens periféricos, significa enfrentar distâncias, transporte precário e uma série de fronteiras simbólicas.

A protagonista é inspirada em uma mulher real com quem o diretor cresceu e compartilhou rolês, madrugadas e perrengues, assim como outros personagens nascem de vivências de amigos da quebrada. O filme se constrói como síntese afetiva da experiência periférica em BH: uma capital que concentra oportunidades e lazer nos bairros centrais, enquanto empurra para as bordas quem depende de ônibus cheios, trajetos fragmentados e conexões inexistentes entre regiões. Mais do que denúncia direta, o curta transforma essa mobilidade desigual em paisagem emocional — cada baldeação, espera ou risco de voltar sozinha de madrugada se torna parte do peso (e da coragem) de existir na cidade.

O elenco é majoritariamente formado por jovens de periferia que conviveram no grupo teatral Palavra Viva, o que dá às interpretações um tom de memória encarnada: Marya Bittencourt, Peron e Aimê interpretam versões de si mesmos, enquanto Nica Alcântara vive Rayra a partir de uma intimidade construída em anos de trajetos, escolas e palcos compartilhados. Guilherme Hamacek, hoje conhecido por trabalhos na TV, retorna às origens em Venda Nova; Rodrigo Arruda e FLIP ajudam a traduzir, em corpo e gesto, a sensação de “atravessar a cidade para existir”.

Visualmente, “Nós é Ruim e Mora Longe” afirma uma estética de quebrada consciente de si: figurinos assinados por Gabriel Mendes e Carolina Baião, com acervo do Garimpo 101, resgatam roupas, cores e exageros que simbolizam o desejo de ser visto — o “close” como necessidade, não como capricho. Locais como o metrô de BH, o Cristo do Barreiro e as ruas em que terra, trilhos e torres de concreto se misturam dão contorno às contradições entre periferia e alta renda, sem perder o foco na subjetividade dos personagens.

Ao seguir Rayra em uma única noite, o curta fala sobre deslocamento e também sobre retorno: o desconforto de ocupar espaços desejados, mas que nem sempre acolhem, e a importância de voltar à base — território, família, amigos — para reorganizar o próprio desejo. Ítalo aponta que, para quem vem da periferia e começa a acessar novos ambientes, olhar para a origem é exercício contínuo de cuidado e coerência. “Nós é Ruim e Mora Longe” nasce justamente desse gesto: transformar em cinema as dúvidas, os medos, a alegria e o cansaço de quem cruza a cidade inteira só para garantir, por algumas horas, o direito de existir em festa.

Cinema é Semana Pop
Siga Luiz Amoasei no Instagram
Conheça a produtora: IdeiaDigital
Conheça a missão do Semana Pop
Lembrando que todo o conteúdo de artigos produzidos por terceiros, não é de responsabilidade do portal Semana Pop.

Compartilhe :

Deixe seu comentário

Deixe um comentário